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A 28 de Agosto de 1963, Martin Luther King Jr., em representação do SCLC ( Southern Christian Leadership Conference), foi um dos líderes dos "Big Six" - movimentos e organizações pró Direitos Civis - que organizaram a célebre Marcha em Washington exigindo trabalho e liberdade para todos.

Publico esta foto porque creio que vem a propósito. E porque nos

conta uma longa história: a da opressão, a do sofrimento, a da esperança, a da resistência, a da solidariedade. O sonho de King não se tornou uma realidade perfeita mas abriu o caminho, estabeleceu as metas e é um exemplo para todos. Não me quero esquecer de toda esta gente que mudou o mundo para melhor.

Foto: reunião de escravos em 1916: Lewis Martin, 100 anos; Martha Elizabeth Banks, 104 anos; Amy Ware, 103 anos; Rev. Simon P. Drew, nascido livre. Cosmopolitan Baptist Church, 921 N Street N.W. (Shorpy). Estas senhoras e estes senhores não viveram o suficiente e não chegaram a ver a impensável mudança. Mas foi a pensar neles que Martin Luther King Jr fez toda a diferença.

 

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Sempre gostei de Margaret Atwood, a romancista, poeta, crítica literária, ensaísta e activista ambiental canadiana que ganhou enorme notoriedade com "Diário de Uma Serva" (1985), recentemente reeditado em português, com o qual ganhou o primeiro de muitos prémios. ("O Assassino Cego", um dos meus livros preferidos ganhou o Booker, em 2000 e espero por "MaddAddam" (2013) em português, o último romance da trilogia "Oryx and Crake".

 A mulher que afirma convictamente que "a estupidez está ao mesmo nível do Mal se considerarmos os respectivos resultados" é autora de duas dezenas de livros de poesia, de livros para crianças, de librettos para óperas (rock), de guiões para televisão. É ainda, uma conferencista memorável com intervenções contundentes no âmbito de vários assuntos - o ambiente, as dívidas dos países soberanos, a religião, a ética, a escrita, a literatura…

Aos 74 anos, é assim que reflecte, no sentido literal, sobre a idade.

Nota: Primeiro no original, o poema está, de seguida, em português, canhestramente traduzido por mim. 

 

Daguerreotype Taken in Old Age
Margaret Atwood 

I know I change
have changed

but whose is this vapid face
pitted and vast, rotund
suspended in empty paper
as though in a telescope

the granular moon

I rise from my chair
pulling against gravity
I turn away
and go out into the garden

I revolve among the vegetables,
my head ponderous
reflecting the sun
in shadows from the pocked ravines
cut in my cheeks, my eye-
sockets 2 craters

among the paths
I orbit
the apple trees
white white spinning
stars around me

I am being
eaten away by light

 

 

 

Daguerreótipo em idade antiga

 

Sei das mudanças, sim

Sei que mudei

 

A quem pertence este rosto inexpressivo

Tristonho e largo, redondo

Suspenso no papel

como se avistado num telescópio

 

uma lua granulosa

 

Levanto-me da cadeira

Repudio a gravidade

Viro-me

e saio para o jardim

 

Revolvo os vegetais

A minha cabeça pesada

A reflectir o sol

Sombras nas cavadas ravinas

Abertas nas minhas faces, nas

Duas crateras dos meus olhos

 

Entre os caminhos

Traço a minha órbita

As macieiras brancas

Brancas estrelas

Revolteando em meu redor

 

A ser devorada

Pela luz.

 

 

 

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As mulheres de idade têm sido, até há pouco tempo, muito mal tratadas. Basta recordar ( e voltarei a referir esta questão ) que toda a iconografia dos contos tradicionais remete para a imagem das "bruxas"  como mulheres velhas e horrendas. Reparem só na eternamente chata Branca de Neve, figura central desse conto tão cheio de sinais exteriores de profunda incorrecção : as meninas são bonitas, boas, puras e desejáveis; as mulheres mais velhas, quando começam a perder o seu bom aspecto, tornam-se más, cruéis, viciosas e horrendas. 

Quanto aos homens, pelo contrário, envelhecem com dignidade: por exemplo, Merlim, o sábio, com as suas belas barbas e cabelos brancos é uma figura imponente e majestosa e não repugnante ou ameaçadora.

Para ilustrar esta ideia deixo-vos com as referências a um conto de Clarice Lispector, cheio de desesperada ironia e cruel sabedoria. Tudo acontece em torno da personagem com o estranho nome de Sr.ª Jorge B. Xavier, a qual, com os seus setenta anos, ainda se deixa embalar pela música do (então jovem) Roberto Carlos. E sozinha, pela calada, dá livre curso às suas fantasias amorosas. No entanto, ao olhar-se ao espelho, acha-se velha. Escreve Clarice:

"Examinou-se ao espelho para ver se o rosto se tornara bestial sob a influência de seus sentimentos. Mas era um rosto quieto que já deixara há muito de representar o que sentia. Aliás, seu rosto nunca exprimira senão boa educação. E agora era apenas a máscara duma mulher de setenta anos. Sua cara levemente maquilhada pareceu-lhe a dum palhaço. A senhora forçou sem vontade um sorriso para ver se melhorava. Não melhorou."

 

A Sr.ª Jorge B. Xavier repara nas discrepâncias entre o seu aspecto exterior e o que sente :

"Por fora – viu no espelho – ela era uma coisa seca como um figo seco. Mas por dentro não era estorricada. Pelo contrário. Parecia por dentro uma gengiva húmida, mole, assim como gengiva desdentada."

 

Para a Sr.ª Jorge B. Xavier o sexo, o erotismo ainda não se volatilizou do seu corpo. Mas na vida, tal como na literatura, as mulheres quando envelhecem têm tendência a tornar-se "invisíveis". É isso que acontece à Sr.ª Jorge B. Xavier.

Mas Lispector continua, implacável:

"Então procurou um pensamento que a espiritualizasse ou que a estorricasse de vez. Mas nunca fora espiritual. E por causa de Roberto Carlos a senhora estava envolta nas trevas da matéria, onde ela era profundamente anónima.

De pé no banheiro era tão anónima quanto uma galinha. A Srª Jorge B. Xavier era ninguém."

 

Há uma revolta brutal que arrebata a Sr.ª Jorge B. Xavier. Porque não poderá ela sentir-se atraída por um jovem, embriagada pela sua música "romântica"?

"…Então quis ter sentimentos bonitos e românticos em relação à delicadeza de rosto de Roberto Carlos. Mas não conseguiu: a delicadeza dele apenas a levava a um corredor escuro de sensualidade. E a danação era a lascívia. Era fome baixa: ela queria comer a boca de Roberto Carlos. Não era romântica, ela era grosseira em matéria de amor. Ali no banheiro, defronte do espelho da pia."

 

A Sr.ª Jorge B. Xavier imagina um momento profundamente erótico mas imediatamente se auto censura

"…Seus lábios levemente pintados ainda seriam beijáveis? Ou por acaso era nojento beijar boca de velha? Examinou bem de perto e inexpressivamente os próprios lábios. E ainda inexpressivamente cantou o estribilho da canção mais famosa de Roberto Carlos: “Quero eu você me aqueça neste inverno e que tudo o mais vá para o inferno”."

 

O conto não acaba bem, evidentemente. Desmoralizada, a Sr.ª Jorge B. Xavier  deixa-se derrotar :

"…Foi então que a Sr.ª Jorge B. Xavier bruscamente dobrou-se sobre a pia como se fosse vomitar as vísceras e interrompeu sua vida com uma mudez estraçalhante: tem! que! haver! uma! porta! de saííííííída!"

 

"À Procura de Uma Dignidade" (Últimos Contos) de Clarice Lispector, autora brasileira nascida na Ucrânia a 10 de Dezembro de 1920. Morreu a 9 de Dezembro de 1977 no Rio de Janeiro.  





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William Shakespeare não é especialmente caridoso ou simpático em relação à idade. As suas personagens mais velhas reflectem, em geral, uma disposição avessa à decrepitude, o que poderá considerar-se "normal", tendo em conta a sua época. No entanto, são inúmeras as reflexões sobre o desgaste do tempo nas várias idades do ser humano: o avanço da caducidade, a diminuição das faculdades físicas e psicológicas são motivo de preocupação e, também, pretexto para apontar uma e outra característica ridícula e até cruelmente cómica . Em "Como lhe Aprouver" (As You Like It - 2.7.143-70), através de Jacques - um beberrão que tanto fala como um bruto como diz coisas de uma beleza inaudita -  compara o mundo a um palco e os homens e mulheres a meros actores com as suas entradas e saídas; e continua a definir as várias (e famosas 7) fases da vida, desde a mais tenra infância nos braços da ama "a sugar e a beliscar", passando pelo estudante, o amante impetuoso, o soldado dado à luta, o justo com a sua barriga protuberante e a sua seriedade, até à velhice, "uma segunda meninice sem memória, sem dentes, sem olhos, sem gosto, sem tudo." ( ver excerto no fim do texto, p.f.). Mas é claro que duas das suas mais famosas criações de velhos insuportáveis são o Rei Lear e Fastaff, tão diferentes entre si como a Lua e o Sol. O drama Rei Lear - uma figura baseada num semi-lendário rei celta, Leir of Britain - conta a história de um poderoso monarca e a sua queda. É triste, sinistro, patético e delirante. Harold Bloom diz que Lear é o protótipo do D.W.E.M., o Dead White European Male, o macho alfa (branco e europeu) que entra numa espiral de decadência, demorando a morrer e irrompendo com feroz teimosia, aqui e ali, um pouco por toda a parte, na literatura e na cultura ocidental. Lear é o exemplo acabado do velho teimoso e vaidoso, despótico e maldoso. Apesar de a princípio reconhecer que a idade já não lhe permite governar eficazmente e que a "reforma" é aconselhável, o seu aparente bom senso transforma-se rapidamente em tolice sobre tolice e a suposta sabedoria que deveria ter acumulado com a idade, antes o arrasta para uma loucura que é fruto, apenas, das suas péssimas escolhas. Por sua causa há suicídios, guerras, traições e uma tragédia que não tem fim.

Quanto ao glorioso Falstaff, que nos delicia em nada menos do que três peças - Henrique IV, parte I e parte II e em As Alegres Comadres de Windsor -  com cada palavra proferida, com cada gesto traçado no espaço, a velhice é um pretexto para "filosofar": ele trava uma batalha feroz e permanente contra o tempo que, inexoravelmente, levará a melhor, mais cedo ou mais tarde. Mas, "enquanto dura vida e doçura" e o pantagruélico Falstaff não se coíbe de satisfazer os seus portentosos apetites, de se entregar a um alegre deboche e de desafiar a opinião comum - o príncipe Hal não mostra espanto se ele for morto por causa das suas ideias. O avançar da idade, para Falstaff impele-o a gozar a vida como se não houvesse amanhã, tornando-o imune ao medo de represálias da sociedade. Enquanto que Lear se deixa avassalar pela idade, perdendo o melhor que tinha - o amor da filha, o reino, a visão, a vida  - Falstaff, consciente da sua finitude, celebra o prazer de estar vivo. Duas visões que, com os seus aparentes contrastes, nos podem fazer pensar.

 

Jaques. All the world's a stage, 

And all the men and women merely players: 
They have their exits and their entrances; 
And one man in his time plays many parts, 
His acts being seven ages. At first the infant,
Mewling and puking in the nurse's arms. 
And then the whining school-boy, with his satchel 
And shining morning face, creeping like snail
Unwillingly to school. And then the lover,
Sighing like furnace, with a woeful ballad 
Made to his mistress' eyebrow. Then a soldier,
Full of strange oaths and bearded like the pard,
Jealous in honour, sudden and quick in quarrel, 
Seeking the bubble reputation 
Even in the cannon's mouth. And then the justice, 
In fair round belly with good capon lined, 
With eyes severe and beard of formal cut, 
Full of wise saws and modern instances; 
And so he plays his part. The sixth age shifts
Into the lean and slipper'd pantaloon, 
With spectacles on nose and pouch on side, 
His youthful hose, well saved, a world too wide 
For his shrunk shank; and his big manly voice, 
Turning again toward childish treble, pipes 
And whistles in his sound. Last scene of all, 
That ends this strange eventful history, 
Is second childishness and mere oblivion, 
Sans teeth, sans eyes, sans taste, sans everything. 

As You Like It (2.7. 143-70) 

 

 


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Toni Morrison - de seu verdadeiro nome Chloe Ardelia Wofford - é uma das minhas autoras de eleição, uma das vozes mais encantatórias e marcantes da Literatura. Nasceu a 18 de Fevereiro de 1931 e apetece-me falar dela porque é uma mulher que, com os seus 82 anos, continua bela, forte, incandescente. O seu livro mais recente chama-se "Home" (2012).

E aqui fica, um excerto do texto que escrevi, no jornal Público, dedicado a outro dos seus romances, "Love" (2003):

Nos Estados Unidos, depois de mais de cinquenta anos de lutas pelos direitos civis dos afro-americanos, o conceito de negritude ocupa agora, como nunca antes, um lugar primordial em todos os campos da actividade humana e Toni Morrison poderá bem estar para a Arte como o Presidente Obama está para a Política. Ela foi pioneira em muitas coisas, a primeira negra a ocupar uma cátedra numa Universidade da Ivy League, a primeira negra a ganhar o Prémio Nobel, uma espécie de Grande Deusa, de oráculo iluminado de uma Cultura profundamente enraizada no tecido social, cultural, moral e criativo da América. No entanto, foi a própria Morrison que afirmou uma vez que, por muito que gostasse das obras de Richard Wright, Ralph Ellison, e James Baldwin não partilhava com os escritores negros a tentação - que pareciam incapazes de contrariar - de olhar por cima do ombro e de explicarem “as coisas aos brancos”. Ela sempre achou desmoralizante que fosse necessário “explicar” o que quer que fosse da vida dos negros aos brancos ou retratar os “negros típicos”.

“Nunca pedi a Tolstói que escrevesse para mim, uma menina de cor nascida em Lorain, Ohio. Nunca exigi a Joyce que não mencionasse o seu catolicismo ou o universo de Dublin… Faulkner escreveu literatura regional e é lido em todo o mundo”, afirmou Morrison que, em “Playing in the Dark” (1992) juntou algumas das suas conferências sobre a imaginação literária na tradição dos brancos americanos, cujos temas - a inocência, o individualismo, a masculinidade, a liberdade - são directamente ditados pela “presença africana”, enquanto faz notar quanto do idioma falado nos Estados Unidos deve à cultura negra.

 A mulher que afirmou que Clinton fora o primeiro Presidente negro dos EUA - porque foi tratado como um “negro” até ao “impeachment” em 1998 e apresentava quase todas as características da comunidade africana, isto é um rapaz do Arkansas,  nascido pobre na classe média, criado mono parentalmente, tocador de saxofone e amante de “junk food” e que , no ano passado, apoiou Obama -  é, desde há muito, considerada como a “Voz” de uma já longa tradição literária que tem as suas raízes na tradição oral e nos cultos animistas trazidos de África, o que passa pela prática evangelista e consequente leitura e interpretação da Bíblia e teve uma profunda implantação em autores, principalmente sulistas, como Eudora Welty e William Faulkner, fortemente influenciado pelas histórias do Mississippi, com o seu estranho sentido de humor e a trágica posição em que se encontravam negros e brancos. Mas quando, em 1955, Faulkner prometia disparar contra os negros nas ruas, Morrison terminava a sua tese de doutoramento em Cornell, sobre ele e Virginia Woolf, não deixando que a cor branca do escritor sulista a impedisse de reconhecer o seu valor como escritor.

 

 

 

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Acabei de entregar a recensão para o Ípsilon de "Velhos Diabos", do autor britânico Kingsley Amis - sim, o pai do "outro Amis" -  ele mesmo um (já morto) velho diabo. É um diabo de um romance onde diabos não românticos, fazem diabruras sem parar. Bebem muito, tentam recuperar as sensações de quando eram mais novos, procuram sem resultados visíveis reavivar a libido ( num tempo distante do século passado, mais ou menos uma década antes da comercialização da famosa pílula azul!), atraiçoam uma e outra vez depois de muitas traições, não amam porque já se esqueceram e travam uma feroz batalha entre eles, fingindo que se estão a divertir. É um livro horrivelmente cómico e implacavelmente triste.

Aqui fica um parágrafo:

"Fossem quais fossem as particularidades do seu rosto, ia ter de fazer a barba. Detestava toda aquela tramóia - dentes, barba, cabelo, roupa -  tanto que às vezes sentia que estava a aproximar-se do ponto em que poria tudo isso de parte para passar a andar só de pijama e de roupão durante todo o dia."

Quem rumina assim é Malcolm. E só não passa mesmo a andar sempre de pijama e com a barba por fazer porque Gwen, a mulher, não o deixa - a(h, as mulheres insuportáveis, como livrarmo-nos delas depois de tanto as perseguirmos?);   e porque tem de ir até ao pub, o Bible - neste caso não haveria grande inconveniente porque só lá estarão os velhos (antiquíssimos) amigos. O problema é que Alun chegou. E Alun quer farra, quer mais copos, mais mulheres, mais divertimento. E quer os velhos diabos com ele… 

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Nós, os mais velhos, bombardeados todos os dias  com notícias funestas, podemos recordar Epicuro de Samos, (341 a.C. –270 a.C.) o filósofo da Grécia Antiga que mostrou (e praticou) a felicidade.

Para Epicuro só importa o tempo presente - é necessário vivê-lo intensamente.

A doutrina de Epicuro é terapêutica (pharmakon) e parte de quatro premissas( tetrapharmakon):

1ª - Não temer os deuses - eles não se preocupam com os homens.

2ª - Não temer a morte – a morte é a ausência de sensações e, por isso, só é dolorosa se a trouxermos para o nosso presente.

3ª - Evitar a dor, combatendo-a com a recordação dos momentos felizes.

4ª - A felicidade é possível. Como? Procurando os prazeres que são fáceis de satisfazer e não "perturbam".

É claro que tudo isto é mais fácil de dizer do que fazer. Mas, entretanto… vamos pensando; e tentando.

Nota: por acaso gosto de "prazeres perturbadores" mas lá vou lendo a "Carta sobre a felicidade (a Meneceu)" e fazendo um aggiornamento das ideias do velhote.  

  

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Hoje, coloco a seguinte questão, ilustrada com um bem-humorado "cartoon", surripiado do New Yorker: como encaramos nós, homens e mulheres, as transformações constantes do nosso corpo? Como as vivemos? Haverá, ainda, uma diferença entre (alguns) homens e (algumas) mulheres, no que diz respeito à forma de experimentar esta mutação? (Os não humanos não têm este problema). O que causa as ansiedades e até depressões, quando nos confrontamos com o envelhecimento?

Nota: quero aqui deixar bem claro que, apesar de nunca ter feito qualquer intervenção cirúrgica de cariz estético – nem usado botox ou similares – não sou de todo moralista em relação a essas práticas. Cada pessoa sabe o que é melhor para ela (ele) e não sou favorável a qualquer fundamentalismo/extremismo. Uso cremes, gosto de ir ao cabeleireiro e a Spas, de arranjar os pés e as mãos e de tudo o que tenha a ver com massagens e outras actividades que não exijam de mim, nem muito esforço nem bisturis e /ou químicos. Mas eu tenho a sorte de ter saúde (por enquanto) e de não me ralar nada com as marcas do tempo. Por enquanto, também…

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Se fizermos as contas, chegamos à conclusão de que os nossos bem amados filósofos da Antiguidade Clássica – o que seria de nós sem eles? – atingiram idades bem avançadas, tiveram tempo para pensar, viver e escrever. Vejam aqui um gráfico interessante que mostra como estes senhores, há 2000 – 3000 anos, se aguentaram muito bem, numa época em que supomos que a esperança de vida deveria ser curta. E se não fossem alguns percalços, como a indigesta ingestão de cicuta, até Sócrates poderia ter vivido mais tempo, era um velhote bem rijo. Nada mal, não acham?

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Esta, sou eu. Sem pinturas nem disfarces. Sem photoshop nem retoques. Estou velha. Uso óculos, o pescoço enruga-se maliciosamente, o formato do rosto altera-se, o queixo está uma lástima, às vezes acordo com uma mão dormente e já não consigo fazer o pino. Quando pratico Ioga - e não só - as articulações rangem e, por vezes, vejo-me aflita para voltar a uma posição "normal". Continuo a gostar de tudo o que me tem alimentado ao longo da vida: os afectos, as artes, a literatura, as viagens, as mudanças (para melhor).

Só me vai faltando a paciência, cada vez mais. Porque é difícil classificar o grau de estupidez de governantes que decidem – por incompetência, preguiça e outras incapacidades – cortar, diminuir os vencimentos de reformados e pensionistas. São obviamente medidas que só trazem desvantagens a um País, a um Estado. É verdade que o número de pessoas de idade aumenta, o que não é de admirar. Cada vez existem mais meios para prolongar a vida – as farmacêuticas, os construtores e inventores de material hospitalar agradecem e os milhões de milhões que são destinados à investigação comprovam, sem sombra de dúvida, que os seres humanos escolhem, inteligentemente, fazer mais e melhor por eles próprios e pelos seus semelhantes, para que gozem uma existência longa, de qualidade e feliz, nesta Terra. Nos países ditos "civilizados" a idade, para além de um repositório de experiência e de sabedoria, é uma mais valia e gera riqueza. Existem inúmeros sectores económicos que podem beneficiar exponencialmente com os reformados que possuem uma certa qualidade de vida: têm mais tempo para gastar, para fazer uma infinidade de coisas que não puderam fazer enquanto cumpriam horários e se ocupavam da sua vida profissional. Há tempo para viajar, para fazer turismo, para ensinar os outros, para fazer voluntariado, para ajudar quem precisa, para frequentar inúmeros cursos e actividades, para gastar dinheiro sem culpa - mais ou menos, de acordo com as possibilidades - enfim, para tirar partido de um sem-número de oportunidades que lhes passaram ao lado, enquanto jovens e de meia-idade. Se as pessoas trabalharam e descontaram para o Estado e se preparam para a segunda parte activa das suas vidas, qual a intenção de lhes colocar barreiras, de elevar muros cinzentos à sua frente? Quem ganha com isso? Ninguém. A quem interessa um País, uma comunidade, em que as pessoas de idade são marginalizadas e maltratadas? Um País em que os mais velhos vivem da caridadezinha ou têm de se privar de uma quantidade de coisas porque aquilo com que contavam lhes foi retirado à má fila?

Tenho especial horror e desprezo por quem trata as pessoas de mais idade como se fossem uns trastes, uns empecilhos, um peso.    Começamos a envelhecer no dia em que nascemos. Este nosso "invólucro mortal" como lhe chamou o grande senhor Shakespeare está em mutação desde sempre e principalmente quando soltamos o primeiro grito, quando inspiramos, pela primeira vez. Enquanto andamos por este mundo, a matéria de que somos feitas(os) move-se e remove-se em constante turbulência. No nosso corpo tudo está sempre a mexer-se a dividir-se, a multiplicar-se, a somar e a subtrair. Há torrentes, enxurradas, caudais, lagos e mares, montanhas e vales, tempestades, tsunamis, avalanches, florescimentos e aniquilações. O processo acumulativo de alterações de estruturas moleculares e celulares não pára. Por isso, tenham muito cuidado connosco. Andamos nisto há muito. Somos fortes e damos luta. Aprendemos com o tempo. Não nos tramem porque ganham mais connosco do que sem nós. Tenho dito!

Nota: tenho particular aversão por quem utiliza, com as pessoas de idade, inúmeros diminutivos, do género: coitadinho do velhinho que vai comer uma sopinha e dormir uma sestinha e antes vai fazer um xixizinho por causa da bexiguinha, etc, etc, etc…!!!!

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